O maior dilema musical da carreira do duo Projeto Chumbo foi o registro das músicas em algum gênero nas plataformas de streaming na Internet. “Não tem a categoria ‘Projeto Chumbo’?”, brincou o produtor Fernando Prado. Registraram em Folk/MPB mesmo. Só que é bem mais que isso, como mostra o trabalho novo, “Vidas Leais”.
Além do folk e da MPB, os irmãos Flavia e Paulo oferecem uma receita das mais contemporâneas, onde flertam com power pop, rock, pop, indie rock, em profusão de idiomas musicais que é traduzido no palco, para onde levam mais de 15 instrumentos diferentes, os quais vão usando em revezamento.
Os dois cresceram em Curitiba em ambiente totalmente musical. A primeira lembrança de Paulo é de subir sobre e quebrar o violão da mãe. Aos 10 anos, quando Flávia nasceu, ele já se aventurava no auto-didatismo em violão, trompete, teclado e por aí vai. Na adolescência, quando começou a formar as primeiras bandas, percebeu que a irmã mesmo pequenina mostrava um timbre com assinatura e era afinada naturalmente.
Até que a idade permitiu que se apresentassem juntos pela primeira vez. Era um show grande, em local aberto, para cerca de mil pessoas, e na semana que o antecedia, o baixista do grupo desistiu. “Eu toco”, disse Flávia, mesmo sem sequer já ter segurado um baixo na vida. Foi, tocou e foi efetivada. Só que a química musical entre os dois não cabia num grupo.
Plombon é o sobrenome deles. Do latim plumbum. Que significa chumbo. Fora que eles queriam usar a forma realista com que encaram a vida com a energia pesada de suas experiências anteriores, em grupos de punk e hardcore. Projeto Chumbo.
Gravaram um disco e estavam sentados na sala de uma rádio quando o amigo Fábio Elias, líder da icônica Relespública, falou que tinha uma surpresa. Tinha mandado algumas músicas para o produtor Rick Bonadio e ele se interessou em conversar com os irmãos.
A conversa virou “Vidas Leais”, sob a direção artística de Rick, que carrega o conceito do duo, de colocar em melodias e textos histórias reais, de gente leal. Fora que igualmente é brincadeira com o filho de Paulo, Eduardo (estrela de alguns clipes do grupo) que, quando pequeno, trocava o erre pelo ele – vidas reais virou vidas leais, na língua própria do Projeto Chumbo.
Nessa língua própria, o folk conversa com a MPB e com o power pop, como em “Cada Mundo que Eu Pisar”, “Me roubaram o pôr do sol”, “De Onde Você Veio”.
Uma boa amostra desse mundo particular do Projeto Chumbo é a música “Sofá”, onde Flávia traça uma declaração de amor a um...sofá. Mas do ponto de vista de as pessoas que querem fazer algo mas que ficam no sofá, enquanto outras fazem tanto que só querem um sofá onde descansar. No meio disso, os vocais de ambos se encontram e definem a sonoridade Chumbo de que falamos.
Há até uma conexão com o primeiro disco com a música Monossílabas II. E tem canções mais indie rock suaves, como “Fala Quem Olha”, outras mais condizentes ao Folk/MPB que tiveram que categorizar o duo, como “Meu esforço é Por Inteiro” e também versões climáticas, puxadas por piano, “Sentindo Nada”.
Ou seja, Projeto Chumbo é único não só no (mix de) gênero(s), mas na totalidade que um projeto musical pode (e deve) alcançar.
LUIZ CESAR PIMENTEL